Base em 1980

Antiga Base Oceanográfica Atlântica

Muito antes que fosse reconhecida como ciência, poder-se-ia dizer que uma espécie de "oceanografia" empírica, primitiva, já despertava interesse e atenção na região de Rio Grande. Por uma questão de sobrevivência, os primeiros navegadores a singrarem nossas águas, no início do século XVI, precisavam observar e compreender as correntes costeiras e oceânicas, as variações do estado do mar e suas respostas aos ventos dominantes. Para não naufragarem, era também de fundamental importância avaliar corretamente as profundidades, a posição dos movediços bancos de areia submersos e a localização precisa dos canais navegáveis, sujeitos as constantes mudanças
Demonstrando tal preocupação, já em 1737, após transpor a perigosa barra, o fundador Silva Paes mapeou os seus canais e também aqueles em torno a Rio Grande, registrando as profundidades e as correntes. Muitas outras observações e registros "oceanográficos" similares foram acontecendo ao longo dos anos, à medida que aumentava o movimento de navios no único porto marítimo da província e também o número de naufrágios nas imediações da então chamada "barra diabólica". Consta que, apenas na primeira metade do século XIX, até junho de 1861, quando ocorreu o famoso naufrágio do Prince of Wales, nada menos do que 198 embarcações haviam soçobrado no inóspito litoral gaúcho, onde o único abrigo das tempestades só podia ser encontrado após a arriscada ultrapassagem da barra de Rio Grande.
A gênese do curso de Oceanologia da FURG está na Sociedade de Estudos Oceanográficos do Rio Grande – SEORG, criada em 20 de março de 1953 por um grupo de entusiastas, entre os quais estavam Eliezer de Carvalho Rios, Boaventura Barcellos, Nicolas Vilhar e Cícero Vassão, que já há algum tempo pensavam em implantar na região um centro para estudos ligados ao oceano. Com o apoio da Prefeitura Municipal, que cedeu o prédio localizado no interior da Praça Tamandaré, onde permaneceu de 1953 a 1972, o Museu Oceanográfico passou a desenvolver pesquisas de laboratório e implantou uma exposição com seu acervo para visitação, contribuindo para despertar na população local o interesse pelas ciências do mar.
A estrutura e prática já utilizadas para a pesquisa oceanográfica desde os anos 1950 foi o embrião do curso de Oceanologia, que viria a ser criado pela Universidade de Rio Grande em 27 de agosto de 1970. Na falta de referências curriculares no Brasil, o Prof. Pery Riet Correa, da Faculdade de Medicina, enviou correspondências para centros universitários de diversos países, entre os quais Estados Unidos da América, França e Rússia, obtendo retorno de algumas universidades, inclusive com o oferecimento de apoio de pesquisadores para a organização do novo curso e a formação de recursos humanos.
Em maio de 1970, o jornal Rio Grande conclamou a mobilização da comunidade local: “... a Congregação da Faculdade de Filosofia aprovou a criação dos cursos de Oceanologia e Ciências Biológicas, dando início assim a realização de uma das aspirações mais altas da comunidade rio-grandina, que em várias oportunidades se manifestou a respeito, através deste jornal. A decisão será agora encaminhada ao Conselho Universitário para a devida aprovação. É anunciada para o próximo ano a entrada da primeira turma do Curso.
 

“O curso de Oceanologia da Universidade de Rio Grande vai iniciar-se e, alentadoramente, conta com um número muito expressivo de candidatos. Estes serão os primeiros oceanólogos do Brasil (...) O curso de Oceanologia nasceu de muita luta. De muita divulgação da sua necessidade e, especialmente, da sua localização privilegiada nesta parte da costa brasileira, onde os estudos são avançados de tudo o que se relaciona com o mar. (...) A comunidade acompanhou, por muitas das nossas edições, o que foi a criação do curso de Oceanologia. Desde que a idéia surgiu, até o momento em que se tornou realidade.” [3]

O Prof. Eliézer de Carvalho Rios, que atuava no curso de Engenharia Industrial, foi indicado para assumir o cargo de Diretor do curso de Oceanologia e coordenar as medidas administrativas para seu funcionamento. A primeira turma era constituída, em sua maioria, por acadêmicos da cidade ou do Rio Grande do Sul. As aulas tiveram início no dia 1° de março de 1971. A aula inaugural, que teve por título “Novos Mundos da Oceanografia”, foi proferida no auditório da Biblioteca Rio-Grandense pelo Diretor do curso.

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Bixos da primeira turma do curso de Oceanologia

Em 1976, seguindo uma tendência mundial, a FURG incorporou o Navio Oceanográfico (N/Oc) “Atlântico Sul” e a Lancha Oceanográfica (L/Oc) “Larus”, permitindo estudos oceanográficos mais aprofundados na plataforma do sul do Brasil e na região estuarina da Lagoa dos Patos. Ainda em plena atividade, o Navio Oceanográfico (NOc) “Atlântico Sul” tem atuado em toda a costa brasileira, desempenhando recentemente papel fundamental para que as atividades do Programa REVIZEE (Programa de Avaliação do Potencial Sustentável dos Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva) pudessem alcançar bom termo.
É possível afirmar que, ao longo de mais de três décadas de atividade, o NOc. “Atlântico Sul” tem sido não apenas um grande diferencial para o êxito da FURG nas ciências do mar. Ele tem contribuído decisivamente e de forma sistemática na formação profissional de inúmeros oceanólogos, na ampliação do conhecimento científico sobre o mar brasileiro e no oferecimento de novas alternativas para a produção pesqueira nacional.
No final de 1976 a Universidade lançou a Atlântica, o primeiro periódico científico editado pela instituição. Ao longo de seus quase 30 anos, a revista “Atlântica” granjeou progressivamente reputação como um periódico científico de qualidade, que pode ser encontrado nas bibliotecas das principais instituições de todo o mundo.
O Mestrado em Oceanografia Biológica foi o primeiro curso deste nível da FURG, tendo sido aprovado formalmente pela CAPES em setembro de 1978. O curso de mestrado contribuiu para ampliar a produção científica na área de oceanografia e para atrair pós-graduandos de diversos países da América Latina. Seu funcionamento também repercutiu no oferecimento de um ensino de graduação, sempre mais atualizado e qualificado.
Dando continuidade ao crescente amadurecimento científico da FURG, foi realizado em novembro de 1982, em parceria com a Duke University (USA), o "Simpósio Internacional sobre Ecossistemas Costeiros: Planejamento, Poluição e Produtividade". Cientistas conceituados, representando 24 países, pela primeira vez convergiram simultaneamente para Rio Grande e para a FURG, com o objetivo de apresentarem e discutirem os resultados de suas pesquisas.
A década de 80 foi caracterizada pela maturidade alcançada pelo curso de pós-graduação; pelo incremento da produção científica; pela crescente captação de recursos externos de diversas fontes para o financiamento dos trabalhos de pesquisa; pelo aumento do número de dias de mar do NOc “Atlântico Sul” e ainda pela consolidação do prestígio dos docentes-pesquisadores da FURG, que passaram a ser cada vez mais requisitados para participar de bancas e oferecer cursos de curta duração, palestras e conferências em outras instituições e em congressos no país e no exterior.
No ano de 1987 teve lugar um dos fatos mais relevantes da história da Universidade, que foi o reconhecimento oficial de sua vocação institucional pelo Conselho Universitário. Através da Resolução N° 14/87 do CONSUN, foi definido como vocação institucional o estudo do "Ecossistema Costeiro", em sua acepção mais ampla. Desde então, a ação da Furg voltada ao ambiente marinho e costeiro passou a se fazer presente em todos os seus cursos de graduação (35) e de pós-graduação (16), o que levou, entre outras coisas, a ter, há dez anos, o primeiro e único mestrado e agora o primeiro e único doutorado em Educação Ambiental do País.
Em 1992 teve início o primeiro curso de doutorado da Instituição, o de Oceanografia Biológica. Em 1997 houve o ingresso da primeira turma de pós-graduandos do curso de mestrado em Oceanografia Física, Química e Geológica. Em 2004 a FURG passou também a oferecer o curso de doutorado nesta área de concentração.
O cultivo de espécies de interesse econômico teve impulso em 1989, com a construção na praia do Cassino dos laboratórios e tanques de cultivo da Estação Marinha de Aqüicultura (EMA). As modernas instalações, construídas com recursos recebidos do BNDES, foram inauguradas em julho de 1991. A consolidação das pesquisas nesta importante área do conhecimento e a titulação dos docentes levou à criação do mestrado em Aqüicultura, aprovado pela CAPES em outubro de 2001. Em julho de 2007 foi aprovado pela CAPES o curso de Doutorado em Aqüicultura.
O ano de 1995 ficou marcado pelo reconhecimento nacional e internacional da FURG, escolhida como a única instituição da América do Sul para sediar um centro de excelência na formação de recursos humanos para o uso adequado dos ambientes costeiros, denominado Train Sea Coast Programme.
Ao lançarmos um olhar para o passado, deslocando-nos para os primeiros anos de funcionamento da Universidade e do curso de Oceanologia, é possível perceber que a elaboração e a implantação do Projeto Atlântico, em meados dos anos 70, foi uma clara ação estratégica, com visão de futuro, que propôs uma missão para a Oceanografia na FURG. Ao recuarmos um pouco mais, ao final da década de 60, concluiremos que também a visão dos pioneiros, que lutaram pela criação de um curso de Oceanologia em nossa Universidade, estava correta. Eles avaliaram acertadamente o potencial de Rio Grande e da FURG para a área de oceanografia.
Localizada em uma cidade cercada pelas águas do Oceano Atlântico e do estuário da Lagoa dos Patos, havia quase um determinismo geográfico e histórico para que a Universidade se dedicasse às ciências aquáticas. Percebendo claramente esta perspectiva, aqueles pioneiros vislumbraram a importância da instalação de um curso de Oceanologia, mesmo cientes de que não havia qualquer parâmetro nacional a ser seguido, uma vez que se tratava do primeiro curso do país.
A verdade é que o êxito da Oceanologia da FURG serviu de modelo para todos os demais cursos que vieram a ser criados no país. Estudantes de países tão diversos como Uruguai, Venezuela, Panamá e Guiné-Bissau foram atraídos para Rio Grande para cursar Oceanologia. Maior ainda foi a representatividade dos que vieram cursar a pós-graduação, com mestrandos e doutorandos oriundos do México, Venezuela, Colômbia, Peru, Chile, Argentina, Costa Rica, Panamá, Cabo Verde e Uruguai. Na última década os laboratórios de pesquisa oceanográfica da FURG também têm recebido solicitações de doutores do Brasil e do exterior interessados em realizar aqui os seus projetos de pós-doutorado. Além dos brasileiros, a Universidade tem acolhido doutores vindos da Alemanha, Espanha, França, Índia, Albânia, Argentina e Cuba.
No presente a FURG possui três campi. O Campus Carreiros abriga a maioria dos cursos de graduação e pós-graduação, a antiga Base Oceanográfica e tantas outras unidades. No Instituto de Oceanografia estão reunidos todos os docentes que atuam na área de Oceanografia, três Programas de Pós-Graduação (Oceanografia Biológica, Oceanografia Física, Química e Geológica e Aqüicultura), um Curso de Especialização (Ecologia Aquática Costeira) e um Curso de Graduação (Oceanologia). Em 2010 teve início o curso de Tecnólogo em Gestão Ambiental, oferecido em Rio Grande e também na cidade de São Lourenço do Sul, RS
A história destes 40 anos de atividade do curso de graduação em Oceanologia da FURG está registrada em imagens nas páginas do livro lançado por ocasião das festividades alusivas a data, que ocorreram durante o IV Congresso Brasileiro de Oceanografia – CBO 2010, realizado de 17 a 21 de maio de 2010 na FURG. Embora todos os fatos ali registrados sejam marcantes, alguns deles foram decisivos para a consolidação da excelência do ensino e prestígio que o curso de Oceanologia possui no cenário nacional e internacional, entre os quais:
  • a Colação de Grau, em 14 de novembro de 1974, da primeira turma de oceanógrafos;
  • criação da Associação Brasileira de Oceanografia – AOCEANO, em 12 de abril de 1975, por um grupo de egressos do curso de Oceanologia;
  • o reconhecimento do curso de Oceanologia pelo Decreto n° 76.028, de 25 de Julho de 1975, primeiro da modalidade no Brasil;
  • a chegada ao Porto de Rio Grande, em 25 de fevereiro de 1978, do Navio de Pesquisa Atlântico Sul;
  • a inauguração da Base Oceanográfica Atlântica – B.O.A. em 28 de abril de 1978;
  • a chegada ao Porto de Rio Grande, em setembro de 1978; das Lanchas Oceanográficas Larus e Sagitta;
  • a transferência do curso de Oceanologia, em março de 1981, para o Campus Carreiros;
  • a entrada em vigor, em março de 1989, da nova estrutura curricular do curso de Oceanologia, contemplando Habilitações em Recursos Naturais Renováveis e Gerenciamento Ambiental, obrigatoriedade de Trabalho de Graduação e 180 horas de embarque, com prazo mínimo de integralização de 5 anos;
  • o início, em setembro de 1989, das atividades da Estação Marinha de Aquacultura – EMA, localizada no Bairro Cassino;
  • a incorporação, na forma de comodato, da Estação da Enseada do Saco do Justino, em junho de 1995;
  • o inicio, em 27 de agosto de 1997, dos cruzeiros do Projeto Treinamento Integrado dos Alunos no NOc. Atlântico Sul e L/Oc. Larus, financiado pelo Programa de Apoio à Integração Graduação/Pós-Graduação – PROIN da CAPES/MEC;
  • a criação por estudantes do curso de Oceanologia, em maio de 1999, da ECOSERVICE – Empresa Junior de Consultoria Ambiental e Oceanografia, primeira do Brasil neste domínio;
  • a entrada em vigor, em março de 2000, de uma nova estrutura curricular para o curso de Oceanologia, contemplando uma formação profissional flexível (sem Habilitações), com integralização de créditos em outras instituições nacionais ou do exterior, a realização de estágio obrigatório fora da academia e prazo mínimo de integralização de 5 anos;
  • a realização, em 8 de novembro de 2006, do 1° cruzeiro do Projeto Amazônia Azul: A Experiência Embarcada, parceria entre a FURG e o Ministério da Pesca e Aquicultura – MPA, propiciando a formação embarcada de estudantes dos demais cursos de Oceanografia do Brasil;
  • a sanção, em 31 de julho de 2008, da Lei n° 11.760, que regulamenta o exercício da profissão de Oceanógrafo no Brasil;
  • a realização, em 19 de maio de 2010, da Solenidade de Reconfirmação de Grau das 36 turmas de Oceanógrafos formados pela FURG, ápice das festividades de comemoração dos 40 anos de criação do curso de Oceanologia;
  • a Colação de Grau, em 20 de abril de 2011, do 1.000° egresso do curso de Oceanologia.

 

Foto CBO1
Solenidade de Reconfirmação de Grau dos egressos do curso de Oceanologia

O acompanhamento da atividade profissional dos egressos do curso de Oceanologia, que é atualizado periodicamente pela coordenação, mostra que é cada vez maior a inserção no mercado de trabalho, tanto no país como no exterior, sendo raro o estado brasileiro, independente de ser ou não costeiro, onde não há um ex-alunos da FURG desenvolvendo atividades próprias da sua formação. O último levantamento efetuado revelou que 77,48% dos egressos permaneciam na área, sendo 60,04% desenvolvendo atividades profissionais e os demais realizando pós-graduação ou buscando trabalho. O estudo mostrou que embora o setor público, em todas as suas esferas, ainda seja o maior empregador, vem perdendo espaço para o setor privado e para o 3° setor da economia, que cada vez mais buscam oceanógrafos para atender as suas demandas por trabalho.
O curso de Oceanologia é reconhecido como um dos melhores do país na modalidade, o que pode ser justificado pela qualidade do seu corpo docente (86,67% dos 75 que atuaram no curso em 2010 têm título do doutor), pela excelente infraestrutura disponível (inclui o NOc. Atlântico Sul e uma diversificada gama de equipamentos e laboratórios que abrangem os temas mais relevantes da ciência oceanográfica) e pelo Projeto Político Pedagógico Pedagógico em vigor (único a exigir que o estágio profissional seja realizado fora da academia). É, por isso mesmo, um curso que atraí estudantes de todo o país e do exterior, que ao sair de Rio Grande levam consigo uma sólida formação profissional e uma experiência de vida singular.